quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Viagem de estudos à cidade do Rio de Janeiro (2012)


O Thau do Blog traz hoje o relato de duas estudantes do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFJF sobre a viagem ao Rio de Janeiro que aconteceu no último dia 26 de Outubro com o Professor e coordenador do nosso Blog Antônio Agenor. Agradecemos às alunas Carina e Isadora pela brilhante dissertação:

Viagem de estudos à cidade do Rio de Janeiro (2012)

Alunos de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Juiz de Fora

Professor: Antônio Agenor Barbosa

Diário e Impressões de uma viagem

Por Carina Folena (9.período) e Isadora Monteiro (4.período) *



  • Sexta-feira, dia 26/10/2012.
Na sexta feira do dia 26 de outubro de 2012, um grupo composto por 28 alunos de diferentes períodos do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFJF, sob a coordenação do Professor Antônio Agenor Barbosa, partiu de manhã bem cedo para o Rio de Janeiro com um objetivo: conhecer a Cidade Maravilhosa. E para “conhecer” temos que olhar, caminhar, discutir, fotografar, observar as pessoas, maravilhar-se com a arquitetura de tantas épocas diferentes, desbravar o ambiente urbano e encontrar as suas belezas naturais, sempre presentes quando o assunto é Rio de Janeiro.

Depois de algumas horas de estrada, chegamos ao Elevado da Perimetral, portão de entrada para a cidade e alvo de muitas discussões devido ao projeto “Porto Maravilha”. O passo seguinte foi chegar a Copacabana para conhecer o albergue onde ficaríamos hospedados e logo depois, em grupos, nos dirigirmos ao primeiro ponto de encontro, na Avenida Presidente Vargas, coração do Rio, para darmos início à nossa jornada de estudos.

Mais do que uma visita a pontos turísticos e marcos históricos do Rio de Janeiro, nesta viagem fizemos, de fato, uma imersão no dia a dia do povo carioca. O deslocamento dos alunos pelo metrô, meio de transporte sugerido pelo professor Antônio Agenor, não só agilizou o acesso aos locais que compunham nosso roteiro de viagem, como também nos permitiu identificar aspectos sociais e econômicos que compõem a dinâmica urbana da cidade.

No decorrer dos quinze minutos do trajeto que liga a estação “Siqueira Campos” (em Copacabana) à Estação “Uruguaiana” (no Centro), observamos apressados trabalhadores que retornavam aos seus postos de trabalho, crianças e jovens que voltavam do colégio no horário do almoço, mas também personagens característicos da urbe tais como: músicos de chorinho que se apresentam e ganham uns trocados no metrô e cantores sertanejos que se dirigiam à Cidade Maravilhosa em busca de sucesso, mas que ali acabaram sem dinheiro, contando suas histórias de estação em estação como forma de sensibilizar os usuários e receberem ajuda para voltarem às suas terras natais. Com isso, percebemos que as linhas de metrô funcionam de fato como vias subterrâneas, não somente pela perspectiva do transporte, mas pelo viés da livre apropriação do espaço e tempo feita pelas pessoas que nelas trafegam e as utilizam como lócus de manifestação, seja ela artística ou um apelo pessoal.  (VER O MAPA 1)

MAPA 1 – Roteiro diurno da primeira parte da viagem de estudos ao Rio de Janeiro.

Chegando à Avenida Presidente Vargas, nossa primeira parada foi na Igreja de Nossa Senhora da Candelária. O templo barroco localiza-se na porção central da via e impressiona pela escala (mesmo estando em uma avenida monumental e muito movimentada), pela história e pela suntuosidade do espaço interno. O entorno também chama a atenção: um dos primeiros edifícios de Oscar Niemeyer no Rio (O Banco Boavista de 1946), edifícios projetados por Lúcio Costa, Paulo Casé (Banco Safra de 1983), a casa França-Brasil (projeto de Grandjean de Montigny de 1820, no estilo Neoclássico, que funcionava como alfândega no período colonial) e o Centro Cultural do Banco do Brasil, primeira sede do banco e atualmente um dos principais espaços de exposições e eventos culturais do Rio de Janeiro. O espaço recebe, até Janeiro de 2013, a exposição “Impressionismo: Paris e A Modernidade”, que conta com obras impressionistas do Museu d`Orsay, em Paris.

Imagem 1: Igreja da Candelária. Foto de Flaviane Silva.
Imagem 2: Centro Cultural Banco do Brasil. Foto de Isadora Monteiro.
Imagem 3: Casa França – Brasil. Foto de Carina Folena.





Imagem 4: Edificações no entorno da Candelária. O quarto edifício da direita para a esquerda é o antigo Banco Boavista, de autoria de Oscar Niemeyer. Foto de Carina Folena.
Imagem 5: Detalhe dos “brises” do Banco Boavista (em reforma). Foto de Isadora Monteiro.

Na caminhada até a parada seguinte, provocados pelo professor, fizemos um pequeno debate. Abrigados numas das tantas galerias (loggia) do centro da Cidade (marcos das proposições do Plano Agache) e cercados de um lado por uma colunata e do outro pela fachada dos edifícios, nos perguntamos: “estamos em um espaço urbano ou arquitetônico?” A pergunta foi pertinente em muitas outras situações, já que no Rio de Janeiro são características essas tipologias de transição do meio urbano para o arquitetônico (talvez uma das possíveis respostas para a nossa pergunta!) e nos fez notar as diferentes maneiras utilizadas por cada estilo (e em cada período) no tratamento do espaço. Pequenas ações de projeto podem conciliar a escala macro da cidade com escala micro, da arquitetura. Como, por exemplo, no Edifício Marques dos Reis onde a porta de entrada se revelou como um estudo de caso interessante: ao passo que seu desenho, como um todo, alude e acompanha a monumentalidade da Avenida Presidente Vargas, a parcela da esquadria que de fato desempenha a função de acesso ao interior já se apresenta com as dimensões compatíveis à escala mais humana do edifício.




Imagem 6: as generosas calçadas e galerias da Avenida Presidente Vargas. Foto de Carina Folena.
Imagem 7: Porta de acesso ao Edifício Marques dos Reis. Foto de Carina Folena.

Um intricado sistema de estreitas ruas é o que separa a suntuosidade da Avenida Presidente Vargas de vias como, por exemplo, a “Ladeira do João Homem” e a “Rua do Jogo da Bola”, que foram os nossos próximos destinos. É interessante perceber como a própria denominação sugere uma mudança drástica de caracterizações espaciais, e de fato, o Morro da Conceição foi uma surpresa para muitos. Inicialmente escondido pelo edifício A Noite (primeiro arranha-céu do Rio de Janeiro, projetado em 1930, pelo arquiteto francês Joseph Gire, o mesmo que projetou o Hotel Copacabana Palace), o Morro da Conceição foi se revelando durante a subida. É um dos quatro morros dentro dos quais a cidade se desenvolveu (por questões de defesa e segurança) e abriga muita história em suas ruas, na arquitetura e no cotidiano dos seus moradores, que têm uma vista privilegiada da cidade


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Imagem 8: Panorama da Cidade do Rio de Janeiro visto do Morro da Conceição em aquarela de Thomas Ender de 1817.

A região do Morro da Conceição tem sido alvo de projetos de enobrecimento, que visam à melhoria do espaço urbano e à atração de pessoas para o comércio e para o turismo. Postes de iluminação pública vêm sendo substituídos por modelos nem sempre tão harmonizados com sua ambiência urbana, casarões e sobrados estão sendo reformados e muitos abrigam ateliers de artistas, bem como estabelecimentos gastronômicos.


  
Imagens 9,10: Restaurante na Ladeira do João Homem, no Morro da Conceição. Fotos de Carina Folena.





Imagem 11: Subida do Morro da Conceição: edifício A Noite ao fundo. Foto de Isadora Monteiro.
Imagem 12: Sobreposição de estilos na vista do topo da Ladeira do João Homem. Foto de Carina Folena.

Mais surpresas nos aguardavam após a caminhada pela Ladeira do João Homem: a estreita via desemboca em um largo onde se encontram instalações militares da época colonial, que integravam o sistema de segurança da cidade, articulado por morros, alguns deles já desmontados. A área que antes servia ao propósito de defesa, e que para tanto dispunha de uma vista privilegiada para o mar, hoje se encontra circundada por inúmeros arranha-céus.




Imagem 13: Vista do largo que se abre a partir da Ladeira do João Homem. Foto de Carina Folena.
Imagem 14: Detalhe da Fortaleza da Conceição. Foto de Isadora Monteiro.

Na caminhada pela Rua do Jogo da Bola, mais singularidades: a arquitetura colonial de influência lusa, com telhas cerâmicas decoradas e fachadas revestidas com ladrilhos, sem deixar de mencionar as imagens de santos que compõem a estética das fachadas das residências.


Imagem 15: Visão da Rua do Jogo da Bola, no Morro da Conceição, por volta de 1940.

Diferentemente da Ladeira do João Homem, essa parte do morro já dispõe de visadas mais amplas para a Região Central e para a área portuária do Rio. É possível avistar a partir da via, importantes marcos da cidade: Corcovado, Estação Central do Brasil e o Morro da Providência, ocupado no final do século XIX por soldados egressos da Guerra de Canudos, que o batizaram de Morro da Favela em alusão à uma mesma planta (originária de uma “fava”) encontrada no povoado baiano. E assim, portanto, “favela”, passou a ser a denominação comum para os assentamentos informais brasileiros desde então.

Finalizamos o percurso pelo Morro da Conceição com uma visita ao Jardim Suspenso do Valongo, que integrava o plano de embelezamento feito pelo prefeito Pereira Passos no início do século XX, e com projeto de autoria de Luis Rey. Com uma temática de contemplação, o Jardim Suspenso do Valongo se apropria do relevo com a consolidação de formas mais orgânicas: o concreto armado estrutura caminhos e reproduz pedras e madeira, de forma a configurar uma ambiência que se aproxime ao máximo da paisagem natural.


Imagem 16: Jardim do Valongo fotografado por Augusto Malta, sem data / Revista Municipal de Engenharia, janeiro/dezembro 1997, p.155 (fonte: http://blogportomaravilha.com/2012/07/12/de-volta-ao-jardim-suspenso-do-valongo)


  
Imagem 17: Alunos de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Juiz de Fora, com o Professor Antônio Agenor Barbosa à frente no Jardim Suspenso do Valongo, no Morro da Conceição, Rio de Janeiro. Foto de: Eulices Cardoso.

Em tempos em que o espaço público se encontra demasiadamente imerso em um programa de atividades e dinâmicas urbanas, uma área da cidade que funcione como um “respiro” em meio a todo caos viário, sempre é muito bem vinda. A beleza pictórica do jardim é ideal para os que buscam um local tranquilo para relaxar (alguns alunos até se sentaram à sombra e tiraram seus calçados), namorar e fotografar, sem contar o ganho ecológico que um espaço desses proporciona à cidade, principalmente na atração de pássaros e outros animais.



Imagem 18: Em um desenho feito na areia, eis a explicação do esquema de formação e defesa da cidade, pelo professor Antônio Agenor Barbosa. Foto de Isadora Monteiro.
Imagem 19: Jardim Suspenso do Valongo. Foto de Isadora Monteiro.

Após finalizarmos o percurso no Morro da Conceição visitamos o sítio arqueológico do Cais da Imperatriz. Durante escavações para a implantação de um projeto de intervenção urbana na Avenida Barão de Tefé, foi encontrado o cais que recebeu a imperatriz Tereza Cristina no período colonial, reascendendo mais um capítulo da história do Rio encoberto em meio aos sucessivos aterros que tornam, hoje, o mar muito distante de seu antigo porto.

Vizinho ao Cais da Imperatriz está o stand de informações do projeto Porto Maravilha no qual paramos para receber algumas informações, finalizando assim o percurso diurno. O espaço é interativo e aborda as questões da revitalização e mobilidade urbana, como também, do projeto do Museu do Amanhã, do arquiteto Santiago Calatrava, entre outros. Esta vultosa obra, que será realizada na zona portuária do Rio até 2016, alterará consideravelmente a paisagem da frente marítima da capital carioca. Entre as obras previstas estão: demolição do Elevado da Perimetral, construção de túneis e passagens subterrâneas, alterações de parâmetros de uso e ocupação do solo, bem como edilícios, além da instalação de ciclovias e de sistema de VLT, integrando os principais pontos centrais.



Imagem 20: Cais da Imperatriz. Foto de Isadora Monteiro
Imagem 21: Espaço Interativo “Meu Porto Maravilha”. Foto de Isadora Monteiro.

O nosso encontro na noite desta sexta-feira, ainda no dia 26 de outubro, foi marcado pelo professor Antônio Agenor em um dos lugares mais emblemáticos da cidade. A Cinelândia, região do entorno da Praça Floriano, é marcada historicamente por ser a primeira praça republicana, onde a igreja (sempre presente nas praças, até então) é substituída por edifícios culturais, institucionais e de lazer. A região é marcada politicamente, por eventos e manifestações de grande relevância para a história do Brasil; arquitetonicamente, pela presença do Teatro Municipal, da Biblioteca Nacional, do Museu Nacional de Belas Artes, da antiga sede do Supremo Tribunal Federal (atual Centro Cultural da Justiça Federal) e do já demolido Palácio Monroe. Culturalmente, a Cinelândia, tornou-se famosa pela presença de diversos cinemas, teatros, cassinos e restaurantes. (VER O MAPA 2)


MAPA 2 – Roteiro noturno da segunda parte da viagem de estudos ao Rio de Janeiro.
Dos vários cinemas que deram nome à região, permanece apenas o Cinema Odeon, ainda em atividade. Coroando a praça, em uma das extremidades, está o imponente Theatro Municipal, edifício eclético inspirado na Ópera de Paris e construído no governo de Pereira Passos.




Imagem 22: Cinema Odeon. Foto de Isadora Monteiro.
Imagem 23: Theatro Municipal. Foto de Isadora Monteiro.
Imagem 24: Palácio Monroe. Fonte:http://brasilarqui.files.wordpress.com/2010/03/palacio_monroe.1.jpg.

Essa característica multicultural imprime ao espaço público da Cinelândia diversas apropriações e para nós, estudantes de arquitetura e urbanismo, foi muito importante poder vivenciá-las no período noturno em plena sexta-feira, transformando-se assim numa experiência muito interessante. Em noite de estreia no Cinema Odeon, a praça se configura como uma extensão do saguão de entrada, perto daquele local, uma animada roda de capoeira também atraia transeuntes para a porção lateral da praça. Em um ambiente tão rico em paisagem arquitetônica e em monumentos, ainda há espaço para intervenções artísticas, como o Labirinto de Vidro, de Robert Morris, intensamente utilizado pelos que caminham em seu entorno. Ao lado, o tradicional restaurante Amarelinho, com suas mesas dispostas nas calçadas, ajuda a diversificar ainda mais o público da Praça Floriano, que com tantos usos e apropriações torna-se um local aprazível, movimentado e confortável.



Imagem 25: Transeuntes atraídos pela roda de capoeira na Cinelândia. Foto de Carina Folena.
Imagem 26: Labirinto de Vidro com Teatro Municipal ao fundo. Foto de Carina Folena.



Imagem 27: Alunos de Arquitetura e Urbanismo da UFJF à frente do Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Foto: Antônio Agenor Barbosa.


Poucos minutos de caminhada e, enfim, chegamos à Lapa. Em meio à costumeira movimentação noturna, visitamos a Escadaria do Selarón, a famosa escada que liga a Lapa ao Bairro de  Santa Tereza e que foi toda revestida por mosaicos de azulejos, vindos de todas as partes do mundo, pelo artista chileno Jorge Selarón. Esse é mais um espaço livremente apropriado pelos usuários, mesmo no período noturno. Várias tribos urbanas juntamente a turistas sentam-se nos degraus da Escadaria do Selarón para conversar, dividir uma bebida, tocar violão ou mesmo apreciar a ambiência urbana ali conformada pelos mosaicos de cores vibrantes.

É interessante perceber que as ruas da Lapa, em geral, possuem esse caráter de liberdade no uso do espaço público: barraquinhas vendendo bebidas, comidas e artesanatos, se dispõem nas vias, atraindo um público diversificado e que, literalmente, “faz sua festa na rua”, festa esta animada por músicos que embalam as noites com ritmos regionais e fazem das vias um grande salão, onde é possível se socializar, dançar, comer e beber sem desembolsar quantias exorbitantes.   

Passando por essas ruas descontraídas e animadas, chegamos aos Arcos da Lapa, o aqueduto do Rio Carioca, que é considerado a maior obra arquitetônica empreendida no período colonial. A estrutura do aqueduto chamou a nossa atenção na noite, contudo os atos de vandalismo a esse importante patrimônio, como pichações, devem ser encarados com atenção. Isso não quer dizer que não haja espaço para intervenções criativas no entorno dos Arcos, ali bem próximo, um trabalho de grafite ilustrando a figura do malandro da Lapa chama atenção pela irreverência e criatividade na apropriação do espaço urbano.



Imagem 27: Escadaria do Selarón na Lapa. Foto de Carina Folena.
Imagem 28: Detalhe do trabalho de mosaico na Escadaria, com a própria figura de Selarón. Foto de Carina Folena.



Imagem 29: Arcos da Lapa. Foto de Carina Folena
Imagem 30: Grafite ilustrando o “Malandro da Lapa”. Foto de Carina Folena.

  • Sábado, dia 27/10/2012
No sábado pela manhã, o grupo se reuniu no Largo da Carioca, de onde partiu para uma caminhada até o Aterro do Flamengo. No caminho, foi observado o Convento de Santo Antônio, localizado no morro de mesmo nome e que, juntamente com a Igreja de São Francisco, forma um dos mais antigos e importantes conjuntos coloniais do Brasil. O Edifício Avenida Central também foi destacado por sua estrutura integralmente metálica. Mas um ponto que chamou atenção é a arte pública inserida nas vias centrais, em especial a intitulada “O Passante” de autoria de José Resende, que reproduz o caminhar do transeunte em uma escala que possibilita a interação do pedestre, seja na captação visual ou passando por entre a escultura. (VER O MAPA 3)


MAPA 3 – Roteiro da terceira parte da viagem de estudos ao Rio de Janeiro no sábado.
  


Imagem 31: Edifício Avenida Central. Foto de Carina Folena.
Imagem 32: Arte Pública “O Passante”. Foto de Carina Folena.

Continuamos a caminhada em direção às sedes da Petrobrás e do BNDES, marcos do conjunto empresarial da área central de negócios da cidade: as características com inspirações modernas (como os brises, as fachadas livres, o terraço jardim, o sistema estrutural aparente, etc) logo saltam aos olhos nesses edifícios. Foi interessante observar as soluções de projetos, como a mudança de direcionamento dos brises no prédio da Petrobrás nas orientações de fachada para leste e oeste (verticais) e norte (horizontais).
 


Imagem 33: Sede Petrobrás. Foto de Carina Folena.
Imagem 34: Sede BNDES. Foto de Carina Folena.

Depois foi a vez de conhecer a Rua da Carioca, um local permeado por exemplares ecléticos, que abrigam um grande número de lojas de instrumentos musicais. Nela visitamos o Cine Íris, construído no início do século XX, em estilo Art Nouveau que, atualmente, só exibe filmes eróticos para um público adulto. Esse foi um final comum a muitos cinemas de rua, que quando não fecharam suas portas cederam a esse tipo de programação. Embora o público do cinema esteja restrito, podemos considerar como uma vitória sua manutenção, inclusive funcional, ainda mais em uma vizinhança que, a contragosto de seus proprietários, vem se tornando foco de atuação de tantos interesses divergentes.




Imagem 35: Rua da Carioca. Foto de Carina Folena.
Imagem 36: Cine Íris. Foto de Carina Folena.
Imagem 37: Apelo pelo patrimônio edificado. Foto de Carina Folena.

Seguimos para a Rua Gonçalves Dias e a próxima parada foi na tradicional Confeitaria Colombo, fundada em 1894, famosa não só por seus produtos como também pelo requinte de suas instalações, rebuscadamente ornamentadas e repletas de vitrais e espelhos que impressionam pelas dimensões.



Imagem 38: Rua Gonçalves Dias. Foto de Carina Folena.
Imagem 39: Interior da Confeitaria Colombo. Foto de Carina Folena.

Na parte da tarde, visitamos a Praça XV. Ali fomos dispensados pelo professor para que, em pequenos grupos, pudéssemos desvendar áreas do entorno da Praça XV a partir do nosso próprio olhar e sob os nossos interesses específicos e não apenas seguindo um roteiro pré-determinado pelo professor. O grupo se dividiu entre as exposições do Paço Imperial, antiga residência da família real no período colonial que funciona atualmente como espaço cultural, os restaurantes e bares do Arco do Teles e a Feirinha de antiguidades que funciona embaixo do Elevado da Perimetral. Mais uma vez pudemos experimentar as variadas apropriações do espaço público e a exploração da paisagem histórica central.

O Elevado da Perimetral foi responsável por um grande dano à ambiência urbana tanto da zona portuária do Rio de Janeiro, quanto de seu Centro. Uma estrutura desse porte impacta o espaço não só do ponto de vista visual como também do conforto ambiental, ainda assim é interessante ver como um elemento tão controverso e adverso, que limou parte da história da cidade, ao mesmo tempo ajuda a recontá-la a partir das ações dos usuários. A feira introduz, à sombra do elevado, cores, cheiros e culturas: são variadas barraquinhas, algumas delas guardam registros importantes da história da cidade e do país, democratizam o acesso à leitura, à música, e conferem àquele espaço um significado único.

Para muitos alunos o Arco do Teles abrigou a nossa parada para o almoço. A estreita travessa delimitada por construções coloniais possui uma ambiência urbana muito interessante, aspecto apropriado pelos comerciantes locais, em grande parte ligados ao setor gastronômico, que se valem da beleza arquitetônica do local, como atrativo para os seus estabelecimentos, utilizando a via como local de disposição de mesas e potenciais espaços para músicas ao vivo, dinamizando consideravelmente a área.



Imagem 40: Feira de antiguidades da Praça XV, sob o Elevado da Perimetral. Foto de Carina Folena.
Imagem 41: Entrada do Arco do Teles a partir da Praça XV. Foto de Carina Folena.




Imagem 42: Ambiência da travessa do Arco do Teles. Foto de Carina Folena.
Imagem 43: Apropriação do espaço na paisagem histórica pelos estabelecimentos comerciais. Foto de Carina Folena.

Cerca de uma hora e meia depois que nos separamos em pequenos grupos, reencontramos o professor Antônio Agenor e a nossa caminhada, num único grupo, continuou em direção ao Palácio Tiradentes, onde hoje funciona a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, um edifício imponente que mistura linguagens de vários estilos (característico dos edifícios ecléticos). O Ministério da Fazenda e o edifício do MEC foram as paradas seguintes: os dois exemplares foram construídos no mesmo período e, apesar disso, têm linguagens completamente diferentes. O primeiro é um edifício acadêmico, mais robusto e de materiais e composição que lembram muito o estilo Neoclássico. O segundo praticamente dispensa descrições, pois trata-se de um ícone da arquitetura Moderna nacional e internacional, se ergue sobre pilotis e traz consigo grandes aberturas em vidro, protegidas por brises horizontais na fachada norte, de maior incidência solar, terraço jardim e paisagismo assinado por Burle Marx e uma relação com o entorno que não deixa dúvidas sobre sua origem.

Aliás, relações são a tônica do projeto de Lúcio Costa em parceria com Le Corbusier, Reidy, Oscar Niemeyer e outros nomes da arquitetura moderna, que substituiu o vencedor do concurso, considerado acadêmico demais para a nova mentalidade que se pretendia instaurar através da figura do Ministério da Educação e Saúde. Todo o projeto foi pensado articuladamente com o desenvolvimento artístico e paisagístico da arquitetura. Esculturas, painéis de Portinari e arranjos paisagísticos conferem ao edifício uma qualidade arquitetônica, ambiental e visual ímpar.


Imagem 44: Alunos de Arquitetura e Urbanismo da UFJF à frente do painel de ajulezos de Candido Portinari, no Palácio Capanema, no Rio de Janeiro. Foto: Antônio Agenor Barbosa.

O cronograma apertado e a ida num fim de semana não favoreceram uma visita interna ao edifício, o que aumentou a nossa vontade de conhecer os espaços interiores de uma obra tão paradigmática no contexto arquitetônico brasileiro, mas pudemos imaginar o quão agradável era o trabalho no ministério, com as aberturas generosas que davam para a Baía de Guanabara. Infelizmente essa visada hoje em dia é prejudicada pelos demais edifícios do entorno, contudo ficam como pontos fortes a abertura ao espaço público, que favorece a livre circulação e apropriação dos jardins do edifício, e que tornam esse espaço atemporal.



Imagem 45: Palácio Tiradentes. Foto de Carina Folena.
Imagem 46: Ministério da Fazenda. Foto de Carina Folena.






Imagens 47, 48, 49 e 50: Antigo Ministério da Educação e Saúde. Foto de Carina Folena.

A nossa caminhada estava se aproximando de seu final e então seguimos para o MAM, Museu de Arte Moderna, localizado no Aterro do Flamengo, cujo projeto é de autoria de Affonso Eduardo Reidy. O complexo de concreto aparente é um marco moderno no Rio e emoldura a paisagem da Baía de Guanabara e do Aterro.

O grande destaque da visita ao MAM ficou a cargo da passagem pela loja Novo Desenho, onde fomos recebidos pelo seu proprietário, o Designer Túlio Mariante. O estabelecimento comercial tem foco na exposição e venda de peças desenvolvidas única e exclusivamente por designers brasileiros, ou fixados no Brasil. Fazem parte do acervo peças de roupa, mobiliário, acessórios, enfeites e artigos de utilidade. Todos os elementos são identificados com o nome do autor e as explicações fornecidas pelo proprietário do local elucidaram muitos aspectos do processo criativo das peças e também nos levaram a desenvolver uma consciência de que o design se difere da simples manufatura porque carrega consigo uma linha de pensamento e de concepção, que faz de cada objeto ali disponível, especial.
 


Imagem 51: MAM. Foto de Carina Folena.
Imagem 52: Espelho d’água no MAM, ao fundo loja Novo Desenho. Foto de Carina Folena.

A visita a parte do Parque do Flamengo também foi muito proveitosa para vivenciarmos os usos e apropriações das áreas verdes em um dia de altas temperaturas e grande incidência solar. Foi interessante ver como os gramados sediam nos fins de semana pequenas rodas de toque de bola entre amigos; na sombra das árvores um grupo de mulheres se divertia fazendo um piquenique; mais adiante casais apreciavam a paisagem da Marina da Glória e a brisa vinda do mar; não tardou para que nós mesmos repousássemos no gramado sob a sombra das árvores; mas as ciclovias e passeios estavam repletas de ciclistas e skatistas, que mesmo com o calor intenso se exercitavam nos canais de circulação do parque.





Imagens 53, 54 e 55: Múltiplas apropriações do espaço no Parque do Flamengo. Fotos de Carina Folena.

A caminhada continuou até o Monumento aos Pracinhas e ao museu dedicado aos mortos na Segunda Guerra Mundial, um espaço monumental e que desperta os mais variados sentimentos, seja através da morfologia, dos dizeres ou painéis que constituem a construção. Todos esses elementos, que transmitem ao usuário uma atmosfera de austeridade e respeito, integrados à beleza da paisagem do Aterro do Flamengo, conferem um senso de paz, pertinente aos que perderam a vida na guerra.



Imagens 56 e 57: Monumento aos Pracinhas sob duas perspectivas. Fotos de Carina Folena.

Na bela paisagem do Aterro do Flamengo foi encerrada a nossa intensa viagem de estudos de dois dias ao Rio de Janeiro. Muitos foram os aprendizados desenvolvidos durante as visitas, muitas foram as histórias ouvidas na ruas, contadas pelos personagens da urbe, muito proveitosa também foi a autonomia que nos foi dada pelo professor para nos movermos livremente pela cidade. Pudemos de fato vivenciar a verdadeira Cidade Maravilhosa, não aquela dos hotéis e dos deslocamentos por automóvel, mas sim a das ruas, dos espaços públicos, dos usos que lhes são conferidos e dos usuários que os dinamizam.

Ver a cidade pela perspectiva do transeunte é fundamental para buscar o equilíbrio entre o meio urbano e a arquitetura , solucionando com cuidado as questões inerentes a esse espaço de transição, tão importantes para as nossas vidas.

* Carina Folena e Isadora Monteiro são alunas do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF – MG) e, convidadas pelo Professor Antônio Agenor Barbosa, participaram da viagem de estudos ao Rio de Janeiro e, a partir de suas impressões de viagem, escreveram este relato.


Por Vitor Wilson

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