quarta-feira, 13 de março de 2013

Igreja e Convento de São Francisco - Salvador


Relatos e pesquisa de uma viagem a Salvador
Por Vitor Wilon


A libertação espiritual trazida pelo Barroco elevou a tradução transcendental dos arquitetos e artistas a partir do século XVI. Durante 150 anos o Barroco se tornou um modelo de vida que acabou por impregnar todas as células da sociedade, desde a música até os penteados de cabelo. A escultura e a pintura se integravam sem transição à arquitetura. Era uma época de esplendor. As Igrejas desse tempo eram a representação máxima dessa vontade.

A Igreja de São Francisco em Salvador - Bahia, é um dos melhores modelos da primeira época do estilo barroco brasileiro. Situada diante do Largo do Cruzeiro, que se articula com o Terreiro de Jesus, é austera no exterior mas decorada com luxo no interior. Foi tombada pelo Iphan, classificada como uma das Sete Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo e faz parte do Centro Histórico de Salvador, que hoje é Patrimônio da Humanidade. Em 1686 foi lançada a primeira pedra do atual Convento, enquanto que somente em 1708 houve o lançamento da primeira pedra da Igreja. A construção iniciada em 1713, foi inaugurada 10 anos mais tarde. No entanto, a decoração interna foi finalizada no ano de 1750.

Só em 1805 as torres foram cobertas com azulejos de cor branca nacarada.

Totalmente revestida em talha dourada, calcula-se que tenha sido utilizado 1 tonelada de ouro no interior. Na sua decoração, aparecem numa profusão exuberante, as formas arabescas, cuja unidade estilística é talvez interrompida somente pelo traçado retilíneo do teto.

Possui três naves, sendo que as laterais são baixas, estreitas e cobertas por uma galeria, e funcionem mais como um deambulatório entre as capelas secundárias. Além da capela-mor, dedicada a São Francisco de Assis a igreja possui oito capelas secundárias, duas delas nos braços do transepto.

As três capelas laterais são dedicadas a Sant'Ana, a Santa Luzia e a Santa Efigênia.

Os painéis de azulejos que revestem as paredes do fundo representam cenas da vida de São Francisco de Assis. As duas pias de pedra foram oferecidas por D. João V. As grades de Jacarandá que fecham as capelinhas laterais são obras do irmão leigo Frei Luís de Jesus. Do lado direito, as capelas são dedicadas a São Benedito, a São Pedro de Alcântara (cuja imagem é obra prima do escultor baiano Manuel Inácio da Costa, executada em 1790) e a São José.

A Capela Mor possui o pavimento em pedra lavrada à maneira de alcatifa, que veio de Portugal em 1738. Os azulejos, com cenas da vida de São Francisco, foram executados em Lisboa por Bartolomeu Antunes em 1737. O célebre quadro de Murilo, que representa o Crucificado abraçando São Francisco, inspirou ao artista baiano Pedro Ferreira a escultura que, desde 1930, ocupa o trono do altar mor.


As pinturas que, em formosas molduras ornam o teto da Igreja são de destro e apurado pincel, segundo informador coevo. O arco cruzeiro ostenta no cimo o escudo franciscano (os braços de Cristo e São Francisco cruzados), bem como as armas de Portugal. Os púlpitos encarnam toda a graça e esplendor do barroco.

Armário em jacarandá.
No altar de Nossa Senhora da Conceição, que faz "pendant" com a de Santo Antônio, encontra-se uma bela imagem atribuída ao citado M. I. da Costa. Segue-se o imponente Altar de Nossa Senhora da Glória. No mesmo altar se venera Nossa Senhora da Piedade, do artista baiano Antônio de Sousa Paranhos, colocada pelo ano de 1843.

O coro dos Religiosos é sustentado por duas colunas de pedra. Os caderais e a estante coral são finíssimo trabalho em jacarandá de Frei Luís de Jesus. Existem aí 8 telas a óleo, não assinadas. Ao centro da artística grade coral, eleva-se um retábulo com a imagem do Crucificado. E se falando em obras de jacarandá, o coro e a sacristia são obras primas deste gênero. Todas de autoria também do franciscano Frei Luís, cognominado o "Torneiro", que realizou na primeira metade do século XVIII.

Nossa Senhora da Conceição no braço do transepto.

Sacristia.
A sacristia possui teto dividido em 48 quadros pintados, com emblema da Ordem no centro. Entre os dois arcazes de jacarandá ergue-se um magnifico altar barroco, com um Cristo em marfim. Os arcazes e os dois armários de gavetinhas são obras do Frei Luís de Jesus. O lavabo de pedra, com a  imagem de Santo Antônio, é de 1710. Nas paredes, os quadros representam cenas da vida de São Francisco. Os azulejos inspiram-se na caça e na pesca.
O rico lampadário de prata que
pende do teto data de 1758.

O átrio entre a sacristia e a igreja apresenta azulejos com cenas bíblicas e, no teto, pintura perspectivada, com a figura de Cristo Ressuscitado. A escada que conduz ao claustro superior tem corrimão de pedra, com mascarões esculpidos nos extremos Superiores.

A portaria foi edificada entre 1749-1755. Os azulejos, que representam cenas da vida contemplativa de anacoretas, foram assentes em 1782. Os oito painéis de pintura sobre tábua representam vultos da ordem franciscana. A pintura do teto, notável pelo jogo de perspectiva, é uma apoteose à Virgem. Os olhares de todas as personagens parecem acompanhar o movimento do observador. Um pequeno altar de talha barroca é dedicado a São Francisco.

A obra do claustro foi iniciada em 1729 e terminada em 1794. O modelo quadrado se inspira nos claustros portugueses do século XVI, possui um sub-solo e dois pavimentos sobre o nível da rua. Os azulejos vieram de Portugal entre 1743-1746. Persistem as dúvidas quanto a fábrica de origem, quanto ao nome do pintor e quanto ao doador (é tradição que tenha sido oferta de D. João V). Os 37 painéis de azulejos do claustro térreo são inspirados nas gravuras do pintor flamengo Oto van Veen, publicadas em 1608 e reproduzidas no livro "Teatro Moral de la Vida Humana", de que o convento possui um antigo exemplar. As epígrafes latinas de cada painel são constituídas por inscrições moralistas das sentenças de Horácio. No Claustro superior os azulejos apresentam cenas de pesca, caça, paisagens, quadros simbólicos dos cinco sentidos, dos meses e dos continentes.

Claustro.
A sala do capítulo é atualmente a sala de visitas do Convento. O primoroso altar é dedicado a Nossa Senhora da Saúde e no seu frontal estão incrustadas relíquias de Santos. As pinturas das paredes ricamente emolduradas, têm como motivos principais várias invocações da Ladainha da Virgem. O forro apresenta pinturas de virgens mártires dos primeiros séculos da Igreja.

Noutros tempos, o complexo recebeu algumas tentativas de restauro, mas com trabalho não especializado, acabou por perder a autenticidade e até mesmo a originalidade de diversas constituintes. Durante as obras de revitalização do centro histórico de Salvador, há poucos anos, a igreja, o convento e seu largo fronteiro também receberam atenção para conservação. Em 2005 os azulejos do claustro foram cobertos por gaze para evitar que a superfície pintada se desprendesse, o que já se verifica em muitos pontos. Em 2006 foi realizado um projeto de pesquisa empregando-se técnicas de fotografia e restauro digital a fim de preservar pelo menos a iconografia dos azulejos antes que ela seja perdida inteiramente. Foi solicitado um restauro emergencial ao Iphan, mas em vista do alto custo da obra, infelizmente até hoje nada foi realizado.




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Por Vitor Wilson

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