quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Arquitetura e Saúde: visão histórica


A arquitetura e a concepção da manutenção da saúde, assim como os demais campos da sociedade se modificaram de forma vertiginosa com os atuais avanços tecnológicos, principalmente no século XX e XXI. A forma de se produzir espaços hospitalares mudou, atualmente a assistência de saúde busca a manutenção da mesma e o caráter curativo foi se especializando nos sistemas secundários e terciários de atenção à saúde. O hospital como um lugar de morte mudou, atualmente o hospital é um espaço de manutenção e reestabelecimento da vida saudável.

Ao longo dos anos, os hospitais são caracterizados funcionalmente e espacialmente através do contexto político de suas épocas e os avanços da ciência na área medicinal. As características dos edifícios de saúde são reflexos destes processos tecnológicos e a forma de pensar da sociedade.
As tipologias destas edificações foram se modificando ao longo dos tempos: 1) na Antiguidade predominavam Pórticos e Templos; 2) na Idade Média, as Naves; 3) na Renascença, a cruz e o claustro; 4) na Era Industrial, dominavam os Pavilhões e na 5) Pré-Contemporânea, os Blocos. Isto está explicitado na imagem a seguir:

Desenho esquemático da evolução das formas hospitalares - MIQUELIN - 1992


Na antiga Grécia, graças a médicos como Hipócrates, foi possível racionalizar e cientificar a medicina. Mas o racionalismo científico convivia com o misticismo e superstição. No entanto havia avanços para a época, onde ocorria uma grande atenção ao conforto dos pacientes. Estes eram alocados juntos às fontes de águas térmicas ao se buscar espaços agradáveis e com belas paisagens como forma de auxílio à cura. A doença tratada como algo pleno, somente seria combatida quando a intervenção chegasse ao corpo e à mente.

No Império Romano surgiu as Valetudinárias que se tratavam de enfermarias militares que visavam o tratamento de soldados doentes e se localizavam no interior das fortificações romanas. Através desta tipologia, obtinham-se melhores condições de iluminação e ventilação naturais dos ambientes internos, pois as Valetudinárias eram constituídas de elementos articulados em torno de um pátio central que garantia para todos os quartos o contato com o ambiente exterior. Além disso, esses espaços eram dispostos em ambos os lados de um corredor central de distribuição, cuja cobertura permitia ventilação permanente.

Durante a Idade Média, vários conceitos se perderam, os hospitais eram comumente associados à ideia de morte, onde a função primordial seria a reclusão de pessoas adoecidas visando o controle das doenças, evitando que as mesmas infectassem outras pessoas. Sendo a recuperação uma busca secundária. Por este motivo, nesta fase pouco se preocupou com o bem-estar e conforto dos pacientes. Os hospitais imitavam as estruturas góticas das catedrais através de largas paredes que se assemelhavam às fortificações e as prisões. As enfermarias eram ambientes insalubres onde a iluminação era comumente realizada por archotes. Sendo a circulação de ar considerada um forme vetor de contaminação, as aberturas eram estreitas e dificultavam a iluminação, torando-os ambientes escuros e insalubres.

No período Gótico, assim como no Renascimento, os edifícios possuíam plantas determinadas pelas técnicas construtivas disponíveis até o momento. No período gótico, a estrutura que prevalecia eram as de suas catedrais, que acabaram sendo utilizadas também nos hospitais. As janelas, altas e estreitas, tornavam-se pequenas com relação à grande dimensão do espaço interno e relacionada às espessuras das paredes, o que impediam que a luz chegasse à todos os cantos do ambiente, proporcionando assim baixos níveis de iluminação e elevados contrastes no ambiente interno.

Até este período da história, os edifícios de saúde não possuíam função de abrigo para os doentes, fazendo com que a linguagem arquitetônica seguisse os padrões dos demais edifícios institucionais da época. Apenas a partir do século XVIII, com a mudança do saber médico e o reconhecimento da doença como fato patológico que as edificações buscaram o caráter terapêutico, passando a serem vistas como um importante instrumento de cura e reabilitação. Surgem assim os primeiros projetos hospitalares dedicados às questões funcionalistas do espaço, que agora assumem nova importância.

A partir deste momento a arquitetura assume o viés de peça fundamental para a promoção da saúde e cura. Surge a necessidade de minimizar os efeitos negativos dos antigos espaços hospitalares tornando as questões funcionais e espaciais mais importantes. Os edifícios hospitalares passam a ser estruturados segundo forte setorização interna baseado nas tipologias dos cuidados oferecidos. Assim a salubridade e conforto ambiental passaram a serem ideias primordiais nos espaços hospitalares.

Na Inglaterra, Florence Nightingale altera os princípios de enfermagem, criando a enfermaria Nightingale. Para ela, nos hospitais a falta de ventilação e iluminação adequadas e a superlotação eram os principais problemas, os quais ela buscou solucionar na sua enfermaria. A enfermaria Nightingale tratava-se de um salão longo e estreito, com leitos dispostos ao longo de suas paredes com muitas janelas que permitiam ventilação cruzada e intensa iluminação e colocou cozinhas e banheiros arejados nas extremidades do salão. O pé direito foi reduzido para maior controle da temperatura. A enfermaria de Nightingale se configurou como a mais popular forma de produção de enfermarias no fim do século XIX, e na virada do século XX.

Modelo de enfermaria Nightingale - Hospital de Dona Estefânea

No século XX, o número de hospitais se expandiu consideravelmente, agora a população tinha maior confiança nos espaços de saúde e o modelo pavilhonar vai aos poucos sendo substituído pelos blocos verticais. Os pacientes passam agora a ficar menos tempo dentro dos hospitais devido aos novos processos terapêuticos e a evolução das ciências, mas por consequência uma despreocupação com a humanização. O desenvolvimento das técnicas de construção também favoreceu a construção dos blocos verticais usando estruturas metálicas e elevadores aliado ao alto custo que a terra passou a possuir.

A tecnologia alcançada no século XX se reflete também na medicina e consequentemente em sua estrutura física hospitalar. As relações de interior e exterior se extinguem causando problemas no tratamento psicológico anteriormente evidenciado com o contato com a natureza e o exterior. Na segunda metade do século XX e com o grande nível de especialização médica, os hospitais passam a ser divididos em setores onde são separadas as atividades especificas como UTIs, pediatria, centros cirúrgicos e áreas administrativas.

No Brasil o modelo do bloco vertical se popularizou durante o modernismo, caracterizado pelo uso de um platô horizontal em sua base. Arquitetos como Rino Levi e Oscar Niemeyer foram ativos neste processo. Um exemplo é o Hospital Larragoiti, atual Hospital da Lagoa, no Rio de Janeiro de 1951.

Hospital Larragoiti

Atualmente não existe mais uma regra de modelo formal para as instalações hospitalares, mas um consenso conceitual onde a humanização e a visão do bem-estar dos pacientes e funcionários são preceitos norteadores desta nova arquitetura. Portanto as necessidades dos usuários são levadas em consideração, seu conforto e estadia. Também na atual sociedade questões como funcionalidade, baixos custos de manutenção, flexibilidade dos espaços e segurança são ideais indispensáveis na nova arquitetura hospitalar.

Fontes
-LUKIANTCHUKI, Marieli Azoia. CARAM, Rosana Maria. Arquitetura Hospitalar e o Conforto Ambiental: Evolução Histórica e Importância na Atualidade. USP

-OLIVEIRA, Juliana Simili de. Humanização em Saúde: arquitetura em enfermarias pediátricas. Dissertação de Mestrado em Ambiente Construído – UFJF. Juiz de Fora 2012

Por Carlos Eduardo Rocha

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